sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

(RE)CONHEÇA-TE A TI MESMO


(re)Conheça-te a ti mesmo. Mesmo...
Mesmo que... não tenha capacidade de conhecer
Mesmo que... não entenda a diferença entre te e ti
Mesmo que... não haja mesmos
Mesmo que... seja você mesmo.

(re)Conheça-te a ti mesmo. Mesmo!
Vislumbre-te a partir dos seus atos, não das falas
Encontra-te onde nunca antes fora para buscar a ti
Exija-te fugir do transparecido, normatizado, enraizado
Perceba-te naqueles locais conhecidos e vividos.

(re)Conheça-te a ti mesmo. Mesmo?
Duvide de ti, não para desmerecer capacidades
Mas sim para estar aberto para o novo, o desconhecido.
Critique a ti, não para fragilizar sua interioridade
Mas sim para não supervalorizar quem eres longe de ti.
Tropece em ti, esvazie de ti, aquieta em ti.

(re)Conheça-te a ti mesmo

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

terça-feira, 17 de novembro de 2015

O COLECIONADOR DE ESPERANÇAS


Lá naquela velha janela sua sombra ainda ficou
Pouco caso dos causos que encantava os viajantes
Olhar sereno de quem já viveu o suficiente para aquietar-se.

Nos porta-retratos ficou o embaçar de imagens de anos
Sofás com retalhos de vidas que por lá perambularam
Caneca de alumino que amassada fica na mesa de jantar.

Histórias vividas, contadas, passadas, repassadas
Descontinuidade intencional dos vilões agora metropolitanos
Deixando pra traz aquilo que trás na bagagem.

Não é que não há sonhos, não. Eles continuam lá
Não é que não mais se tenha fé, não. Ela também está lá
Não é que perdemos a coragem, não. Lá está.

O que nos aconteceu é que acostumamos a viver
Olhamos para o céu na espera de um milagre
Numa indizível angustia em busca de esperanças.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

TEMPORALIDADE DO FIM


Acordo, olho em volta, e percebo que ainda não é o fim
Não sei se é o meio, ou é início, mas sei que não é o fim
No fim as coisas acabam e no fim tudo daria certo
Só sei que ainda não é o fim.

Desejaria o fim para balbuciar novas canções
Almejaria com todas as minhas forças ao fim chegar e lá ficar
Anelaria existencialmente por conseguir levar minha vida ao fim
Já não sei reconhecer o fim.

Continuo andando rumo ao fim que desconheço
Tropeço no meio-fio, olho os vidrais noviços
E continuo indo... apenas para o fim
Fim de mim mesmo.

Lá no fim tudo se explica, tudo se encaixa, tudo se revela
No fim parece que encontramos nossas ancoras
No fim abaixamos nossas armas de guerra
No fim sabemos que não é o fim.

O fim poderia ser o meio de uma história mal contada
O fim pode até ser o início distorcido de vacilantes
O fim quem sabe é apenas uma traquinagem do tempo
O fim, sim, é uma metáfora de nossas desvirtudes.

O fim é para aqueles que já cansaram dos meios
O fim é o descanso para os primeiros veleiros
O fim é tormento eterno do inacabado conformado
O fim não é para aqueles que continuam acordando.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

DECEPÇÃO


Vivemos em busca da felicidade, mas ela bem sabe se esconder
Vamos então pelas frestas, tentado vislumbrar um pouco de esperança
Corrermos, deliramos, sonhamos, muito queremos, mas, nada.

O que realmente temos de tangível, dia a pós dia, é a decepção
Decepção de querer, merecer, mas não conseguir
Decepção de tentar, balbuciar, mas nada atingir
Decepção de existir, sobreviver, mas sempre capotar
Só sabemos da ignomínia da felicidade por celebramos as decepções.

Nesta decepção de não chegar, chegamos em vários lugares
Chegamos no vazio, que representa muita de nossas conquistas
Chegamos no nada, que significa tudo para nossas escolhas
Chegamos longe, que fica bem pertinho de onde sempre estivemos
Decepção... precisa ser relida... precisa ser vivida.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

terça-feira, 22 de setembro de 2015

ANACRÔNICO


A felicidade é sempre um recorte do pretérito
É construir pontes com tudo aquilo que se foi
E vislumbrar a utopia daquilo que poderia então ser,
Mas que não se fez presente.

Nesta existência de ritmos cronológicos eu não me encontro.
Prefiro flutuar, divagar e desritmar quem eu sou
Pois afinal não sou tão linear,
Mesmo que em tudo em linhas pareço escrever.

O tempo não existe para resenhar o futuro,
Nem para desbravar o intocável passado,
Muito menos serve para compreender o presente.
Sou apenas, completamente, anacrônico.

Meu futuro está preso ao passado que viverei
Meu presente ainda vai ser escrito
E tudo aquilo que eu vivi vai se dar na atualidade
Existo numa incompletude temporal.

O tempo existe para que tenhamos espaço para produzir
O tempo existe para que tenhamos pressa
O tempo existe para que tentemos chegar longe
Por isto, quero apenas perder tempo.

Minha felicidade não está no tempo
Meu cativeiro poético não sucumbe à cronologia
Minhas lágrimas são livres para correr lentamente
Minha vida é um espetáculo com única apresentação pública.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

RESPOSTAS


As respostas não mais respondem as questões
Talvez, porque as respostas não sejam suficientes
Ou que sabe, as perguntas não sejam aceitáveis.
A busca se expandiu até os limiares das interrogações
Substituindo as afirmações tão retoricamente elaboradas.

Seria possível responder as questões
Se ao menos pudéssemos saber o que realmente se pergunta
Assim poderia inventar respostas afirmativas, conclusivas.
Afinal, repostas são apenas dizerem para acalmar as dúvidas
São construções racionais para uma geração empobrecida.

Bem queria eu ter as respostas, mas a mim coube às perguntas
Cheias de interrogações inquietantes e confortantes
Transtornos de uma vida rotineira, acomodada, utópica.
Pergunto-me se haveria respostas para minhas indagações
Mas lamento! Minhas questões não suplicam respostas.

Para que, então, haver respostas para um convívio distante?
Se ao menos pudesse tatear as aspirações ensurdecidas
Dali poderia encontrar as repostas que me fariam perguntar.
Perguntar não responde. Nem responder provoca perguntas.
São respostas autoritativas para perguntas inconclusas.

Ainda busco respostas!

Mas agora fico a esperar as perguntas.

Para, então, te responder...

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

ZUMBILÂNDIA


Acordo pensando no que trabalho
Trabalho pensando no porque trabalho
Almoço rápido para voltar ao trabalho
Continuo trabalhando rápido para acabar com o trabalho

Busco promoção para melhorar o trabalho
Recebo mais dinheiro, recebo mais trabalho
Não sobra tempo depois do trabalho
Sigo comprando o que dá com o que trabalho

Relaciono com as pessoas do trabalho
Tempo comercial para amizades do trabalho
Devido ao tempo surgi a fofoca no trabalho
Trabalho para minha imagem não ser rotulada no trabalho

Não sei quem eu sou sem trabalho
Nem imagino quem eu sou no trabalho
Só sigo trabalhando
Dá trabalho se manter no trabalho

Ouvi falar que existe vida fora do trabalho
Deve ser folclore dos que perderam o trabalho
Não me dou ao trabalho de perder minha vida sem trabalho
Minha vida é o trabalho.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

terça-feira, 28 de julho de 2015

PRESOS


Prezamos por não sermos presos
Predigamos uma liberdade carcerária
Interpelamos nossos grilhões urbanos
Vãs visões de um imaginário contemporâneo.

Assistimos o choro de mães desmamadas
Contemplamos a tristeza de pais despaternalizados
Vislumbramos a angustia de jovens desvirtuados
Vã geração em grilhões de suas próprias ambições.

Cantamos as antigas melodias da infância
Brincamos com as memórias de tempos de rua
Saudamos as rizadas sem sentido que davam sentido a vida
Vã consciência a sufocar na expectativa das amarras do hoje.

Duvidamos da existência da bondade humana
Interrogamos a futilidade do que nos define
Afirmamos a convicção de nossas dúvidas
Vãos soluços de uma algemada temporariedade existencial.

Presos da liberdade de redes sociais
Gente de conexões capitalistas
Humanos de virtualidade fotográfica
Vã existência de perfil.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

segunda-feira, 20 de julho de 2015

CORAÇÕES NA CONTRAMÃO


De longe se vê a esfinge desta insignificância democrática
Bravura de gente de não sabe pensar além de si
Gesticulações de desfile carnavalesco da consciência
Gritos de revolução sem absolutamente nenhuma evolução.
Somos frutos de um recapeamento da esperança.

Nas plenárias educacionais se ouve os gemidos triunfantes
Celebrações do fracasso coletivo de uma nação sem noção
Motivo de júbilo ainda que desvirtuoso
Vencer! Mesmo que faça todos perder, sem entender.
Somos frutos de uma pavimentação do horror.

No amor não se tem mais enraizamentos a fim de florescer
No caminhar não interessa mais aonde se quer chegar
Na paisagem as estatuas parecem ter mais vida do que nós
Nas sementes se escondem escolhas encubadas, a morrer.
Somos canteiros em ilhas asfálticas a esperar.

Há tanta gente na contramão que não sabemos mais o sentido
Seguimos um rumo, sem prumo, porém convictos de ir em frente
Olhamos para trás e vemos o que nos traz a avenida
Sacolejamos nossas paixões por pura convicção do vazio.
Somos placas sinalizadoras que insiste: “devagar”.

O que somos em tantas metamorfoses multifacetadas
Petrificação de mobilidade que vai se esvaindo pouco a pouco
Sem perceber, pouco entender, mais muito entreter
Caminhamos na contramão dos que estão na contramão.
Somos corações betumizados a pedir carona.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

quinta-feira, 25 de junho de 2015

DESERTO DE TIJOLOS


Flores de plástico, água tratada, pássaros entalhados
Tudo, de repente, virou artificial.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Onça pintada, pintada, e, micos leões dourados, desbotados
Sei que um dia tudo já teve mais cores.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Carne de açougue, alface do verdurão, manga da prateleira
Já tivemos dias mais perto da natureza.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Suco em pó, macarrão instantâneo, salgadinhos com aromas
Sei que um dia tudo já foi menos sofisticado.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Canções sem instrumentistas, tamborins desocupados
Até parece que desumanizaram nossos barulhos.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Virtualidade ao clique do delete, então, intentos apagados
Houve dias que tínhamos medo de errar.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

Gente em pixels, terror do outro lado da tela, distantes
Teve dias em que as notícias nos afetavam.
Não há mais vida, apenas tijolos emoldurados.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

sábado, 6 de junho de 2015

CÁLICE


Pai, afasta de mim este cálice!
Afasta-se de mim com este cálice!
É para mim este cálice?
Pai?!

Pai, afasta de mim este cálice!
Cálice de meu pai.
Pai que pode afastar de mim.
A mim?

Pai, afasta de mim este cálice!
Não quero cálice,
Já tenho vários cálices do pai
Cálice...

Pai, afasta de mim este cálice!
Tenho pai, tenho cálice,
Tenho a mim, tenho este,
Afaste-se!

Pai, afasta de mim este cálice
Perto de mim, cálice...
Longe do pai, cálice...
Cale-se.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

domingo, 24 de maio de 2015

THE FAST FOOD LIFE


Não há mais tempo. [esbraveja o vacilante]
Desde quando? [questiona o desatento]
Não conseguiremos chegar lá. [interpela o perdido]
“Tempo é dinheiro”. [argumenta o vendável]
Temos tempo de sobra! [disfarça o preguiçoso]
Sempre haverá tempo! [corrigi o interessado]
Quanto tempo você precisa? [gesticula o pernicioso]
Não temos tempo para isto... [irrita o orador]
Mas, não tinha tempo deste o início. [reitera o antenado]
Já gastamos muito tempo. [desafortuna o viajante]
Tempo investido! [retruca o palestrante]
Perdemos tempo investido? [contra-argumenta o sonhador]
Pegue o tempo de volta. [atravessa o desvairado]
Reitero: não há mais tempo... [continua o apavorado]
Se não há mais, o que estamos fazendo? [silencia o sábio]
Perdendo tempo, oras! [arrazoa o navegador]
Mas... não temos mais tempo. [grita o herói]
Então perdemos. [sussurra o tempo]

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

segunda-feira, 11 de maio de 2015

A GENTE


A gente se torna agente
A gente se torna deficiente
A gente se torna irrelevante

A gente se torna aparente
A gente se torna insolvente
A gente se torna ausente

A gente se torna delirante
A gente se torna solvente
A gente se torna indigente

A gente se torna inconveniente
A gente se torna displicente
A gente se torna recipiente

A gente se torna inocente
A gente se torna negligente
A gente se torna indecente

A gente se torna gerente
A gente se torna atendente
A gente se torna servente

A gente se torna repetente
A gente se torna consciente
A gente se torna impaciente

A gente se torna bivalente
A gente se torna convalescente
A gente se torna permanente.

[por Vinicius Seabra | escrito no outono de 2015]

quarta-feira, 15 de abril de 2015

RELEITURA DRUMONDIANA


No caminho tinha uma pedra,
Em meio as pedras havia um caminho.
No meio do caminho tinha uma pedra,
Em meio aos caminhos haviam pedras.

Nunca me esquecerei das pedras ou dos caminhos,
Esforçar-me-ei para lembrar qual a diferença entre ambos.
Descobrirei vidas de retinas, fadigadas, ultrapassadas,
Tempos sem caminhos, tempos apenas de pedras.

Nunca me esquecerei, mesmo que não me lembre,
Que havia caminhos entre as pedras.
Afinal, se há caminho, há pedras;
Se há pedras, há caminhos.

[por Vinicius Seabra | escrito no inverno de 2014]

terça-feira, 7 de abril de 2015

RENSGA!


Sou a pessoa mais feliz do mundo
Rensga!

Sou o mais completo homem que existiu
Rensga!

Tenho tudo o que sempre quis
Rensga!

Nunca chorei na vida
Rensga!

Faço o que quero, quando quero
Rensga!

Não dou satisfação da minha vida para ninguém
Rensga!

Não tô nem ai para o que você acha de mim
Rensga!

Já sei de tudo que preciso para viver
Rensga!

Todos querem ser como eu
Rensga!

Mas...

É tudo mentira
Vixi!

[por Vinicius Seabra | escrito no inverno de 2014]

sexta-feira, 27 de março de 2015

IDIOSSINCRASIA COPYRIGHT


Somos todos tão iguais,
Gente de sonhos semelhantes,
De tristezas produzidas em massa,
De alegrias mediáticas coletivas.

Não penso, logo existimos.
Não sou, então caminhamos.
Não sei, portanto nos definimos.
Não quero, por fim temos dúvidas.

Personalidade, pessoalidade, peculiaridade,
Individualidade, singularidade, originalidade,
Diferença, estranheza, certeza,
É preciso redescobrir o singular das sentenças.

O todo não representa as partes,
A soma das partes não coincide com o todo,
Mesmos sendo todos, em parte.
Parte-se do pressuposto da indivisibilidade do ser.

Nunca aceite congelar-se nos fotos-sensores,
Resista às tentações do selfie moderno,
Arrisque-se a descobrir o impossível não reproduzível,
Seja unicamente que és.

[por Vinicius Seabra | escrito no inverno de 2014]

quinta-feira, 12 de março de 2015

SEM SENTIDO


Eu tinha um cavalo prateado
Que andava de bicicleta pelos céus
Parecido com peixinho dourado
Que anda nos pastos verdejantes

Eu conheci um amigo desprovido
Que vestia de branco numa apresentação teatral
Parecido com as flores do deserto
Que assobiam cânticos molhados

Eu presencie um urso polar despolarizado
Que procurava um leão para dialogar
Parecido com os “homos”
Que choravam por ganhar presentes

Eu queria um sorvete de vento
Que conversava sobre a vida
Parecido com uma bala de mascar
Que jogava voleibol

Eu ganhei um queijo
Que queixava sobre as vacas nos currais
Parecido com as girafas
Que plainavam sob a lua

Eu sei o que estou dizendo
Que tais palavras são sem sentido
Parecido com nossas vidas modernas
Que vagueiam na existência.

[por Vinicius Seabra | escrito no inverno de 2014]

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

EUS


Na primeira pessoa do singular eu não sou
Quando muito, apenas estou.
Eu não é palavra que denote singularidade
Minha pessoalidade é mutável.

De tempo em tempos me redescubro,
Me reinvento, ou me reinventam.
Encontro uma nova forma de ser eu mesmo
Geralmente muito diferente do eu que conheço.

Eus é mais apropriado para mim
Reflete mais minha versatilidade caótica.
Que de tão confuso e intruso me descubro
Vislumbro o novo que antigamente aqui existia.

Eus é a sétima pessoa do plural
Existência que de tão multifacetada,
Não consegue ser conjugada.
A esta, resta apenas ser admirada pelos errantes.

Eus aprende a conviver com os dissabores da vida,
Consegue ser o que precisa ser no momento,
Não precisa ser sempre o mesmo,
Não precisa ser um monumento.

Quisera eus conseguir me livrar do eu
E, enfim mergulhar na vida,
Descobrir a brevidade das histórias
E, então, fazer um retalho de minhas existências.

[por Vinicius Seabra | escrito no inverno de 2014]